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O governo norte-americano entra no novo ano tendo pela frente os problemas que ficaram de 2021, além de novos desafios evidentes e graves para 2022. Mais uma vez, a pandemia que parecia estar sob controle ressurge: a variante ômicron voltou a lotar hospitais, devido à importante parcela da população norte-americana não vacinada, e coloca a economia em risco, provocando um tsunami de incertezas. Thiago de Aragão, analista político O ano promete não ser fácil para o presidente norte-americano. Em novembro, os EUA viverão suas eleições legislativas. O presidente corre um risco real de perder sua maioria no Senado e, assim, ter seu governo enfraquecido. Além dos problemas domésticos, o governo norte-americano vive um momento de instabilidade internacional como há muito não se via. A crise entre Rússia e Ucrânia se intensifica quase que diariamente. O anúncio nesse fim de semana de que a Finlândia cogita avançar suas negociações para ingressar na OTAN, fez com que o governo do presidente Vladimir Putin afirmasse que uma adesão da Finlândia (e Suécia) obrigaria a Rússia a tomar ações “políticas e militares”. Essa crise na Europa coloca uma enorme pressão nos EUA para que os aliados da Otan adotem um posicionamento uníssono capaz de solucionar a crise no Leste da Europa de uma forma diplomática que não envolva um trágico conflito militar. Nesse último fim de semana, o presidente Biden comunicou ao presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, que em caso de um ataque russo, a resposta norte-americana seria “decisiva”. A compreensão de um lado tende a ser bem diferente do que é expresso pelo outro: “decisivo”, certamente não envolveria engajamento militar dos Estados Unidos, mas sim, sanções. Crise com a China Um outro tema não tão imediato, mas potencialmente mais perigoso e impactante, é a crise no Mar do Sul da China e o risco de invasão chinesa a Taiwan. Por mais que uma invasão dificilmente ocorra em 2022, o aumento das tensões vem se sustentando continuamente nos últimos anos. A ampliação da presença militar chinesa na região é grande o suficiente para indicar que uma ação contundente está sendo planejada cada vez mais detalhadamente por Pequim. Já os EUA respondem na mesma moeda, aumentando sua presença naval e invocando aliados por meio do QUAD (grupo formado por Estados Unidos, Índia, Austrália e Japão) e do AUKUS (aliança entre Austrália, Reino Unido e Estados Unidos) para que estejam prontos para qualquer tipo de colaboração necessária. A crise no Mar do Sul da China é um dos pontos mais críticos da política externa norte-americana, mas não a única nos desafios envolvendo as duas potências em 2022. Existem vários capítulos dentro dessa tensão entre os países, envolvendo uma corrida tecnológica sem precedentes e disputa por influência política, econômica e comercial em diversos pontos do mundo. A crise iraniana Como grandes crises não chegam sozinhas, o Irã volta à cena como um ponto de alto risco para a política externa norte-americana. A saída dos EUA do JCPOA (acordo entre o P5+1 e o Irã para negociações de controle do programa nuclear iraniano) durante a administração Trump foi uma das piores decisões de política externa tomadas por um governo norte-americano nos últimos anos. Graças à implosão dessa negociação, o Irã não só multiplicou a quantidade de urânio enriquecido, como se aproximou da China e selou acordos de financiamento e exportação de petróleo que garantiram um enorme fôlego ao governo de Teerã. A decisão esdrúxula de Trump ainda não foi corrigida por Biden, fazendo com que o Irã ganhe, a cada dia, mais estatura para negociar seu programa nuclear quando (e se) voltarem à mesa de negociações. Mais problemas que soluções O mundo ainda passa por crises agressivas na Venezuela, guerra civil na Etiópia, crise humanitária em Mianmar, guerra sem fim no Iêmen, Talibã no Afeganistão etc. Se tudo isso traz uma dificuldade enorme para a política externa norte-americana em momentos onde sua política doméstica anda em ordem, quem dirá agora, quando a polarização e falta de unidade interna puxam, naturalmente, a atenção da Casa Branca para dentro? O novo ano verá ainda, infelizmente, o surgimento de mais problemas do que soluções. As duas grandes superpotências da atualidade, EUA e China vivem um “front” duplo de instabilidade interna e externa. Isso, geralmente, faz com que decisões emotivas ganhem força em relação a decisões racionais. O perigo mora justamente aí.